A poluição por resíduos plásticos é um problema ambiental crítico e crescente, devido à imensa produção mundial de materiais como o PET (polietileno tereftalato), amplamente utilizado em embalagens e garrafas plásticas. A lentidão dos processos naturais de decomposição do plástico constitui um grande desafio para a preservação dos ecossistemas terrestres e aquáticos. Felizmente, a biotecnologia oferece soluções promissoras, com destaque para a descoberta da bactéria Ideonella sakaiensis 201-F6, um microrganismo capaz de degradar o PET em tempo relativamente curto e com alta eficiência.
Essa bactéria, identificada primeiramente por pesquisadores japoneses em 2016, utiliza um mecanismo enzimático altamente especializado para "digerir" o plástico. As enzimas responsáveis pertencem principalmente a duas proteínas: a PETase (ISF6_4831) e a MHETase (ISF6_0224). A PETase inicia o processo degradando o polímero PET em um composto intermediário chamado MHET (mono(2-hidroxietil) tereftalato). Depois, a MHETase atua sobre o MHET, hidrolisando-o em suas unidades monoméricas mais simples: ácido tereftálico e etilenoglicol, ambos benignos ao meio ambiente.
O funcionamento dessas enzimas envolve um processo catalítico de quebra das ligações éster do PET, que são duráveis e resistentes à degradação convencional. A PETase apresenta uma estrutura tridimensional capaz de reconhecer e se ligar especificamente ao plástico PET, fragmentando a cadeia polimérica em moléculas menores. Em seguida, a MHETase complementa essa ação, degradando os intermediários produzidos para compostos reutilizáveis. Esses monômeros podem ser reciclados para a produção de novo plástico, criando um ciclo sustentável de utilização e redução do impacto ambiental.
Estudos recentes demonstraram avanços significativos na engenharia dessas enzimas, incluindo sua reprodução sintética em laboratório. Pesquisadores conseguiram otimizar a eficiência da PETase e MHETase, acelerando o processo de degradação até seis vezes em relação ao que ocorre na bactéria natural, abrindo caminhos para aplicações industriais em larga escala. O potencial para essa tecnologia vai além da simples degradação, pois permite a bio-reciclagem química, transformando resíduos plásticos em matéria-prima útil, reduzindo a demanda por petróleo e outras fontes não renováveis.
Apesar das vantagens evidentes, os desafios são grandes, principalmente na adaptação dessas enzimas e bactérias para ambientes industriais, onde fatores como temperatura, pH e a presença de contaminantes podem influenciar a eficácia do processo. Além disso, a integração desse sistema biológico aos métodos tradicionais de reciclagem requer investimento contínuo em pesquisa para otimizar a produção enzimática e a aplicação eficiente em diferentes tipos de resíduos plásticos.
Em síntese, a biotecnologia, por meio da exploração do potencial de Ideonella sakaiensis 201-F6 e suas enzimas, representa uma solução de vanguarda para a problemática do descarte de plástico, combinando inovação científica e responsabilidade ambiental. A contínua pesquisa e desenvolvimento nessa direção prometem transformar a gestão de resíduos globais e contribuir para a construção de uma economia circular mais sustentável.
Referências
Yoshida, S., Hiraga, K., Takehana, T., Taniguchi, I., Yamaji, H., Maeda, Y., ... & Oda, K. (2016). A bacterium that degrades and assimilates poly(ethylene terephthalate). Science, 351(6278), 1196-1199. https://doi.org/10.1126/science.aad6359Knott, B. C., Erickson, E., Allen, M. D., Gado, J. E., Graham, R., Kearns, F. L., ... & Wagner, A. (2020). Characterization and engineering of a two-enzyme system for plastics depolymerization. Proceedings of the National Academy of Sciences, 117(41), 25476-25485. https://doi.org/10.1073/pnas.2006753117
CAS Insights. (2024). Principais descobertas científicas e avanços importantes para 2025. CAS. https://www.cas.org/pt-br/resources/cas-insights/descobertas-cientificas-2025-tendencias-emergentes-para-ficar-de-olho
Sociedade Brasileira de Microbiologia. (2024). Descoberta bactéria capaz de digerir plástico. https://sbmicrobiologia.org.br/descoberta-bacteria-capaz-de-digerir-plastico/
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