No que parece ser o enredo de um filme de ficção científica, cientistas confirmam que as placas tectônicas que compõem a África estão se separando. Este fenômeno, conhecido como "rifting" continental, não é novo na história da Terra — foi assim que a América do Sul se separou da África, criando o Oceano Atlântico. Agora, testemunhamos o início de um processo semelhante em tempo real.
O epicentro desta transformação é o Sistema de Rifte da África Oriental (EARS, na sigla em inglês), uma das maiores e mais ativas zonas de fenda continental do mundo. Estendendo-se por mais de 3.500 quilômetros, desde o Golfo de Áden, no norte, até Moçambique, no sul, esta vasta depressão geológica é a manifestação visível da lenta, mas implacável, separação da Placa Africana em duas novas placas: a Placa Núbia (a maior parte do continente) e a Placa Somali (o Chifre da África).
O que está acontecendo sob a superfície?
A crosta terrestre não é uma casca sólida e contínua, mas sim um quebra-cabeça de placas tectônicas que flutuam sobre o manto semi-fluido do planeta. Impulsionadas por correntes de convecção de rocha derretida (magma), essas placas estão em constante movimento, colidindo, deslizando umas sobre as outras ou, como no caso africano, se afastando.No Rifte da África Oriental, o motor por trás da separação é uma enorme pluma de magma superaquecido que sobe do manto, empurrando e afinando a litosfera (a camada rígida externa da Terra). Esse processo estica a crosta, causando fraturas, terremotos e intensa atividade vulcânica. O resultado é a formação de um vale profundo, o Vale do Rift, que se alarga a uma taxa de poucos milímetros a centímetros por ano — um ritmo comparável ao crescimento das unhas humanas, mas que em escala geológica é extraordinariamente rápido.
Um dos pontos mais ativos e geologicamente significativos deste sistema é a Depressão de Afar, ou Triângulo de Afar, uma região que abrange partes da Etiópia, Eritreia e Djibuti. Este local é um "ponto de junção tripla", onde as placas Núbia, Somali e Arábica se encontram e se afastam, tornando-o um dos lugares mais quentes e geologicamente instáveis da Terra. É aqui que os cientistas podem observar em terra firme processos que normalmente ocorrem nas profundezas dos oceanos.
Evidências Visíveis de um Continente em Divisão
Embora o processo leve milhões de anos para se completar, seus efeitos já são visíveis. Em 2005, o mundo geológico voltou sua atenção para a Etiópia quando uma fissura de 60 quilômetros de comprimento e até 8 metros de largura se abriu no deserto de Afar em apenas dez dias, um evento desencadeado por uma erupção vulcânica. Mais recentemente, em 2018, uma grande rachadura surgiu subitamente no sudoeste do Quênia, cortando uma rodovia e forçando a evacuação de famílias.Esses eventos dramáticos são a prova cabal de que as forças tectônicas estão ativamente remodelando a paisagem. À medida que o vale afunda, ele acabará por atingir uma altitude abaixo do nível do mar. Nesse ponto, as águas do Mar Vermelho e do Golfo de Áden inundarão a depressão, criando um novo mar estreito que, com o tempo, se alargará para formar um vasto oceano.
Um Novo Mapa para o Mundo
A concretização deste evento geológico irá redesenhar radicalmente o mapa da África e do mundo. Países que hoje não têm acesso ao mar, como Uganda, Ruanda, Burundi e Zâmbia, poderão ganhar um litoral. Nações como Quênia, Etiópia e Tanzânia seriam divididas, com uma parte no continente principal e outra em uma nova massa de terra, uma espécie de "Ilha Africana" gigante, comparável em tamanho a Madagascar.A formação de um novo oceano terá implicações profundas não apenas para a geografia, mas também para os ecossistemas, o clima e até mesmo para a geopolítica e o comércio global, com o surgimento de novas rotas marítimas.
Embora a humanidade possa não estar aqui para velejar no "Oceano Africano", o estudo do Rifte da África Oriental oferece uma oportunidade única para compreender as forças fundamentais que moldaram nosso planeta por bilhões de anos e que continuam a transformá-lo diante de nossos olhos. Estamos testemunhando, em câmera lenta, o nascimento de um oceano.
Referências
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