Cientistas russos anunciaram um avanço significativo na biotecnologia ambiental: o desenvolvimento de colônias de bactérias modificadas capazes de degradar petróleo em temperaturas extremamente baixas. A inovação promete resolver um dos maiores pesadelos da engenharia ambiental: como limpar vazamentos em águas gélidas, como as do Ártico ou do oceano profundo.
O Problema do Frio
A natureza já possui seus próprios faxineiros. Existem bactérias que naturalmente se alimentam de hidrocarbonetos (os compostos químicos do petróleo). O processo, chamado de biorremediação, é amplamente usado em regiões tropicais e temperadas.No entanto, em águas congelantes (entre -2°C e 4°C), a maioria dessas bactérias "hiberna" ou tem seu metabolismo drasticamente reduzido. Elas simplesmente param de comer. Isso faz com que vazamentos em regiões polares persistam por décadas, destruindo ecossistemas sensíveis.
A Solução Russa: "Tunando" Micro-organismos
Pesquisadores de institutos de microbiologia da Rússia focaram em bactérias psicrofílicas (que "amam o frio"). Esses micro-organismos já vivem naturalmente no gelo e no permafrost. O problema é que, originalmente, elas não eram muito eficientes em comer petróleo.A equipe utilizou técnicas de edição genética e seleção adaptativa para criar uma "superbactéria". O processo funcionou de duas formas principais:
- Seleção Natural Acelerada: Colocaram bactérias do Ártico em tanques com petróleo e foram selecionando apenas as que sobreviviam e consumiam o óleo, repetindo o processo por gerações.
- Engenharia Genética: Introduziram plasmídeos (pequenos anéis de DNA) contendo genes que produzem enzimas específicas para quebrar as moléculas de carbono do petróleo.
Como Funciona a "Digestão"?
Para o leigo, o processo pode ser comparado a um banquete microscópico. Ao serem lançadas sobre uma mancha de óleo no mar gelado, essas bactérias começam a secretar enzimas que "cortam" as longas cadeias de petróleo em pedaços menores.O resultado final dessa digestão não é tóxico. As bactérias transformam o perigoso óleo cru em subprodutos inofensivos: basicamente água e dióxido de carbono (CO₂), além de biomassa (mais bactérias, que eventualmente servem de alimento para o plâncton).
Segurança e Futuro
Uma dúvida comum é: "Essas bactérias modificadas não vão fugir do controle?"Os cientistas garantem que não. Essas bactérias são projetadas para serem dependentes do petróleo. Quando a mancha de óleo acaba, elas morrem de fome ou sua população reduz drasticamente aos níveis naturais, integrando-se ao ecossistema sem causar desequilíbrios.
Com o aumento da exploração comercial e de rotas de navegação no Ártico devido ao degelo global, o risco de acidentes aumentou. A tecnologia russa chega como uma apólice de seguro ambiental necessária, provando que, às vezes, as menores formas de vida são as únicas capazes de resolver nossos maiores problemas.
Referências Bibliográficas
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