A poluição plástica é uma crise global. Todos os anos, produzimos centenas de milhões de toneladas do material, e uma porção significativa acaba em aterros sanitários e oceanos, onde pode levar séculos para se decompor. Itens feitos de poliuretano — como espumas, solas de sapato, peças de automóveis e adesivos — estão entre os mais resistentes e problemáticos. Mas e se a própria natureza tivesse uma solução para digerir esse resíduo persistente?
A resposta surpreendente veio de uma expedição de pesquisa liderada por estudantes da Universidade de Yale, nos Estados Unidos. Ao explorar a flora da Amazônia equatoriana, eles isolaram um fungo que não apenas conseguia sobreviver em uma dieta exclusiva de poliuretano, mas que prosperava com ela.
O Superpoder do Pestalotiopsis microspora
O que torna o Pestalotiopsis microspora tão especial é sua capacidade de realizar um processo chamado biorremediação. Ele secreta uma classe de enzimas, conhecidas como serina hidrolases, que são capazes de quebrar as complexas e resistentes ligações químicas que formam o poliuretano. Essencialmente, o fungo "digere" o plástico em um nível molecular, transformando-o em compostos orgânicos que servem como seu alimento.A descoberta mais impressionante, no entanto, foi outra característica única deste organismo. Os pesquisadores descobriram que o fungo pode realizar essa proeza mesmo em ambientes anaeróbicos, ou seja, na ausência total de oxigênio. Esta é uma qualidade crucial, pois o fundo de aterros sanitários, onde a maior parte do nosso lixo plástico está enterrada, é um ambiente com baixíssima ou nenhuma concentração de oxigênio.
Enquanto outros organismos que degradam plástico geralmente precisam de oxigênio para atuar, o Pestalotiopsis microspora estaria perfeitamente adaptado para trabalhar no epicentro do problema: em meio a toneladas de lixo compactado.
Uma Solução Viável para o Futuro?
A descoberta, publicada originalmente no periódico Applied and Environmental Microbiology, abriu um novo e empolgante campo de pesquisa. A ideia de pulverizar lixões com esporos de fungos ou criar reatores de biodegradação para resíduos plásticos deixou de ser ficção científica e passou a ser uma possibilidade tangível.Contudo, os cientistas alertam que ainda há um longo caminho a percorrer. Os desafios incluem entender como aplicar o fungo em larga escala de forma segura e eficiente. Questões como a velocidade da decomposição e os subprodutos gerados pelo processo precisam ser rigorosamente estudadas antes que a tecnologia possa ser implementada comercialmente.
Mesmo assim, a existência do Pestalotiopsis microspora é uma prova poderosa da genialidade da natureza. Em um dos ecossistemas mais ricos e ameaçados do mundo, pode residir a chave para resolver um dos problemas mais urgentes que nós mesmos criamos. É um lembrete fascinante de que, muitas vezes, as soluções mais inovadoras estão escondidas no mundo natural, esperando para serem descobertas.
Referências
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Yale University. (2012, March 15). Student finds plastic-eating fungus in Amazon. YaleNews. Recuperado de https://news.yale.edu/2012/03/15/student-finds-plastic-eating-fungus-amazon
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