Pode parecer roteiro de ficção científica, mas é um fato astronômico confirmado pela NASA: a Terra tem companhia. Além da nossa Lua principal, um asteroide foi capturado em uma dança gravitacional complexa com o nosso planeta, agindo como uma "segunda lua" ou, no termo técnico correto, uma "quasi-lua".
Este objeto, designado como 2022 YH3, não ficará conosco para sempre. De acordo com os cálculos orbitais do Centro de Estudos de Objetos Próximos à Terra (CNEOS) da NASA, este companheiro cósmico nos deixará por volta do ano 2083.
Mas o que exatamente é uma "quasi-lua" e por que ela tem uma data de validade?
A "Lua" que não Orbita a Terra
O primeiro ponto e o mais importante é: este objeto não orbita a Terra da mesma forma que a nossa Lua. A Lua está gravitacionalmente ligada ao nosso planeta. O asteroide 2022 YH3, por outro lado, está gravitacionalmente ligado ao Sol.
Tanto a Terra quanto o 2022 YH3 orbitam o Sol, e ambos levam quase exatamente o mesmo tempo para completar uma volta: um ano.
A melhor analogia é imaginar dois carros de corrida em pistas vizinhas de um autódromo gigante (o Sistema Solar). A Terra está em uma pista estável e quase circular. O asteroide está em uma pista ligeiramente diferente, um pouco mais elíptica.
Por estarem em "sincronia" (o que os astrônomos chamam de ressonância orbital 1:1), do nosso ponto de vista aqui na Terra, parece que o asteroide está lentamente dando voltas ao nosso redor. Na realidade, ele está apenas "dançando" conosco ao redor do Sol, às vezes se adiantando, às vezes ficando para trás, em um complexo padrão de saca-rolhas.
Um Vínculo Temporário
Esta dança orbital é incrivelmente delicada. A órbita do 2022 YH3 não é perfeitamente estável. Ao longo das décadas, os minúsculos "puxões" gravitacionais da própria Terra e de outros planetas, como Vênus e Júpiter, começam a somar.Essas perturbações alteram lentamente a trajetória do asteroide. As simulações de computador da NASA, que podem projetar essas órbitas com grande precisão, mostram que por volta de 2083, esses puxões acumulados serão suficientes para "libertar" o 2022 YH3 da sua ressonância com a Terra.
Quando isso acontecer, ele deixará de ser nosso companheiro e seguirá seu próprio caminho, como qualquer outro asteroide viajando sozinho pelo Sistema Solar.
Não Estamos Sozinhos
Embora o 2022 YH3 tenha ganhado as manchetes por seu "prazo de validade" relativamente curto, ele está longe de ser nosso único companheiro. A Terra, na verdade, quase sempre tem uma ou mais quasi-luas.O mais famoso e estável deles é um asteroide chamado Kamoʻoalewa (ou 2016 HO3). Descoberto em 2016, o Kamoʻoalewa está em uma órbita muito mais estável e nos acompanha há pelo menos um século. Ele permanecerá como nosso "mini-vizinho" por muitos séculos ainda. Estudos sobre o Kamoʻoalewa sugerem que ele pode até ser um pedaço da nossa própria Lua, ejetado por um impacto antigo (Sharkey et al., 2021).
Outro objeto, o 2023 FW13, foi descoberto mais recentemente e pode estar nos acompanhando desde 100 a.C.
Por que isso Importa?
A descoberta e o rastreamento desses objetos não são apenas uma curiosidade astronômica. Eles são uma parte vital do programa de Defesa Planetária da NASA (NASA, 2023).Monitorar objetos próximos à Terra, mesmo aqueles que não representam ameaça de impacto, nos ajuda a entender a dinâmica complexa do nosso Sistema Solar. Cada "quasi-lua" é um laboratório natural para estudar como os planetas afetam seus vizinhos menores.
Portanto, da próxima vez que olhar para o céu, saiba que nossa Lua majestosa não é nossa única companhia. Temos um amigo secreto, o 2022 YH3, que continuará sua valsa conosco por mais algumas décadas, antes de desaparecer na imensidão do espaço.
Referências
NASA. (2023, 27 de abril). NASA’s Planetary Defense Coordination Office. NASA Science. Retirado de https://science.nasa.gov/planetary-defense/
NASA/Jet Propulsion Laboratory. (2025). CNEOS - Center for Near-Earth Object Studies. California Institute of Technology. Retirado de https://cneos.jpl.nasa.gov
Sharkey, B. N. L., Reddy, V., Malhotra, R., et al. (2021). Lunar-like silicate material forms the Earth quasi-satellite (469219) Kamoʻoalewa. Nature Communications Earth & Environment, 2, 231. https://doi.org/10.1038/s43247-021-00303-7
Wiegert, P., Innanen, K., & Mikkola, S. (2000). Earth’s co-orbital asteroids: A common phenomenon. The Astronomical Journal, 119(6), 3049–3054.
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